O semblante de Halima mostra mais do que seus cinquenta anos de vida. Brasileira, filha de pais palestinos refugiados da guerra e viúva, ela conta sua história voluntariamente: “Os brasileiros gostam de ouvir minha história porque são muitas as diferenças culturais", explica em tom de desabafo.
Halima e seus irmãos - duas mulheres e quatro homens - foram criados sob a rigidez de seu pai, que educou a família com punhos de ferro. “Ele era muito bravo e, por isso, nós o respeitávamos demais", diz. Reprimida, a moça só veio namorar aos 20 anos um rapaz árabe conhecido de sua família. Após três meses se casou e mudou para o Rio Grande Sul. O casamento arranjado durou apenas um ano: “Nós não nos conhecíamos, não sabíamos nada um do outro, não podia dar certo".
Aos 21 anos e com uma vida pela frente, Halima sonhava, como grande parte das mulheres, em casar e ter filhos. No entanto, sob a intensa supervisão do pai, a moça manteve-se solteira por mais de uma década. Segundo ela, a família islâmica jamais permitiria que se envolvesse com um rapaz de outra religião. "Minha vida foi muito sofrida, aliás, a vida das filhas de imigrantes palestinos é muito difícil devido à severidade dos pais", conta.
A primeira a desafiar o poder paterno foi a irmã mais nova de Halima, que conheceu um brasileiro e brigou com sua família para se casar. Os irmãos não passaram por esse problema já que os homens podem se casar com mulheres de outras religiões, pois a intenção é que os maridos convertam suas esposas ao islamismo. Halima revela que a repressão sofrida dentro de casa é a origem de alguns distúrbios psicológicos, não só nela, mas também em sua irmã mais velha que jamais se casou e ainda hoje mora em companhia da mãe.
Quando completou 31 anos Halima estava totalmente desiludida. No entanto, nessa época teve uma das maiores surpresas de sua vida: seu pai lhe chamou para uma conversa e lhe deu permissão para se relacionar com homens não adeptos ao islamismo. Halima não acreditava que ainda pudesse formar uma família.
Após anos de solidão Halima conheceu um rapaz italiano, o qual tempos depois seria seu marido. Halima finalmente havia encontrado o amor de sua vida e,aos 36 anos, se casou. O fruto do matrimônio é Hana, uma linda criança de dez anos de idade.
Tudo parecia bem, mas a vida havia reservado mais uma surpresa para Halima: após 13 anos de casamento, seu marido faleceu em decorrência de um câncer de pele. O mundo de Halima caiu pois, além do companheiro, ela havia perdido seu braço direito.
Após um ano, Halima ainda não superou completamente o trauma e tenta reconstruir sua vida. No Brasil conta apenas com sua mãe e seus irmão, nunca foi a Palestina. Os tios mais próximos estão nos Estados Unidos e na Jordânia, por isso, os conhece apenas por telefone.
Halima tinha todos os motivos para jogar tudo para o alto e desistir, afinal a vida foi muito dura para ela. No entanto, há uma força que não se sabe de onde vem. Apesar de perdida em seu tempo, luta a todo instante para conseguir tocar a vida. Está a um mês de se tornar mestre em Comunicação Social pela Universidade Estadual Paulista, provando sua força interior. Mesmo viúva, Halima ainda se mostra apaixonada, pois quando fala de seu marido é nítido o brilho em seus sofridos olhos.